sexta-feira, 18 de abril de 2008

Levando a vida de letra


Por que ficar triste se há tanta coisa alegre por aí? A aparente simplicidade da frase de dona Nair de Araújo mostra bem como esta mulher de 79 anos encara a vida. Professora por 45 anos e poetisa desde criança, ela transmite sua alegria de viver nos poemas e crônicas já bem conhecidos do seu círculo de amizades, principalmente o que cultiva no Sesc Aguar Verde, ponto de encontro diário.

Embora a agilidade mental que exercita no cotidiano, Nair não tem como hábito ficar recordando o que já viveu. Para ela, o mais importante é o que vive atualmente e o que ainda virá. Esse despojamento em relação ao passado talvez seja um dos motivos pelos quais diz nunca ser vítima do estresse ou da depressão. E essa postura de satisfação em relação ao mundo tem – segundo ela – ligação direta com o uso que faz da linguagem. “É pelo dom da palavra que consigo este meio de vida”, explica.

O contato com as primeiras letras e outras atividades artísticas remonta de sua infância. Nascida em Morretes quando sua família se preparava para mudar para Curitiba, ela conta que por ter vindo ao mundo praticamente em meio a uma viagem, sempre gostou de viajar, costume que não pretende interromper tão cedo. Enquanto fazia sua formação estudantil, primeiro no Instituto de Educação e depois na Faculdade de Filosofia Irmãos Maristas, Nair já exercitava seus dotes artísticos. Chegou a ser locutora da Rádio Santa Felicidade – depois transformada em Rádio Marumby - , onde apresentava o programa Chá das Cinco. Também passou a aprender violino, enquanto se exercitava em seus primeiros textos poéticos. “Sempre gostei de expor idéias – sempre usei bem a palavra”, explica.

Essa habilidade ela também usava para ajudar amigas em assuntos do coração. Sua fama de artesã das palavras fazia com que suas colegas a procurassem sempre que tivessem algum problema afetivo. Seus poemas (assinados pelas colegas) fizeram tanto sucesso que logo passou a ser chamada de Santo Antônio devido aos reatamentos de namoros que conseguia.

Apesar de uma abundante e ininterrupta produção de textos – “tenho vários cadernos repletos de poesia”-, ela nunca os publicou. “Acho que ainda não chegou o tempo”, comenta, acrescentando, porém, que tem o projeto de produzir um livro. Mas que não será de sua autoria. Atualmente ela anda embevecida com a precoce produção do neto (NOME) de apenas 8 anos, que já vem criando suas próprias histórias. O talento do neto foi alimentado pelas sessões de histórias na hora de dormir. Toda noite, cada um contava uma história de sua autoria. “Era um notável inventar”, diz.

Mas mesmo sem nenhum livro publicado, parte do trabalho de Nair já chegou a pessoas de várias partes do Brasil e do exterior. Em abril último, por exemplo, ela esteve participando do 9º Encontro da 3ª Idade do Mercosul. Ganhou o troféu do primeiro lugar na expressão artística, por declamar uma poesia, e ainda recebeu uma medalha pelo trabalho apresentado ser de sua autoria.

Atualmente ela trabalha na produção do que irá apresentar no próximo encontro, no ano que vem, em Camboriú, intitulado “Meu próximo, meu ser”. Sem pressa, ela lapida os termos de sua nova obra. Essa vitória sobre a ansiedade , para Nair, é um dos aprendizados trazidos pela maturidade. “Hoje eu entendo e aceito o nosso passar. E também passei a entender as diferenças”, conta. Sobre suas esperanças, diz que é a de viver para continuar observando as coisas.

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